Dólar vai a R$ 5,85 com aversão ao risco por temor de recessão nos EUA; Ibovespa cai 0,41%

Após uma manhã marcada por instabilidade e trocas de sinal, o dólar ganhou força ao longo da tarde no mercado local, em sintonia com o comportamento da moeda americana no exterior, e encerrou a sessão desta segunda-feira, 10, acima de R$ 5,85.

Temores de recessão nos EUA por conta da política econômica de Donald Trump, em especial a novela em torno das tarifas de importação, provocaram uma onda de aversão ao risco que contaminou divisas emergentes. Ontem, indagado sobre a possibilidade de uma retração da atividade, Trump desconversou e disse que a economia americana vai passar por um “período de transição” com as medidas que estão sendo adotadas.

“O dólar até chegou a cair um pouco pela manhã, mas o movimento se inverteu à tarde, com piora das moedas emergentes. Há um sentimento de insegurança com as próximas iniciativas de Trump em relação às tarifas e seu impacto na economia”, afirma a economista-chefe do Ouribank, Cristiane Quartaroli.

Com mínima a R$ 5,7732 pela manhã e R$ 5,8716 à tarde, o dólar à vista terminou o pregão em alta de 1,07%, a R$ 5,8521, maior valor de fechamento em março. Em 28 de fevereiro, a divisa fechou a R$ 5,9163. Apesar do repique hoje, o dólar ainda recua 1,09% nos quatro primeiros pregões do mês.

O economista-chefe da corretora Monte Bravo, Luciano Costa, afirma que nos últimos dias houve uma mudança na leitura sobre o impacto da política tarifária de Trump, com investidores passando a dar mais ênfase as chances de perda de fôlego aguda da atividade.

Ele observa que, embora a economia americana ainda se mostre sólida, houve alguns sinais de desaceleração ao longo da semana passada com dados mais fracos de consumo das famílias e aumento do déficit comercial. Além disso, indicador do Federal Reserve de Atlanta que tenta medir a evolução do PIB em tempo real sugeriu contração forte da atividade no primeiro trimestre.

“O que estamos vendo hoje é um risk off global que acabou pegando as moedas emergentes. As bolsas em Nova York abriram em queda e o Nasdaq passou a cair mais de 4% ao longo da tarde, enquanto as taxas dos Treasuries curtos recuaram mais de 10 pontos”, afirma Costa.

Com a perspectiva de desaceleração da atividade nos EUA, os preços das commodities caem, o que também joga contra o real e seus pares emergentes, observa Costa. As cotações do petróleo recuaram mais de 1,5% hoje, passando a acumular desvalorização de mais de 5% em março.

Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY, que já recua mais de 3% em março, hoje apresentou uma alta modesta com a aversão ao risco e conseguiu superar a linha dos 104,000 pontos na máxima do dia.

Investidores aguardam a divulgação na quarta-feira, 12, do índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) de fevereiro para calibrar as apostas para a retomada e a magnitude do alívio na política monetária neste ano. Por ora, as expectativas são de um corte acumulado de 75 pontos-base, com início a partir de maio ou junho.

O diretor de Pesquisa Econômica do Banco Pine, Cristiano Oliveira, afirma que o aumento da incerteza global dita o comportamento dos ativos de risco. Ele avalia que as medidas anunciadas por Trump, nos campos comercial, fiscal e político, são “bastante inconsistentes”.

“O mercado passou a precificar risco de estagnação econômica e inflação mais elevada no médio prazo, atribuindo maior probabilidade de o Fed cortar a taxa de juros a fim de evitar recessão”, afirma Oliveira.

Ibovespa

Com a guerra tarifária ainda no radar, e receio crescente de recessão nos Estados Unidos – especialmente após o presidente Donald Trump ter admitido essa chance -, o Ibovespa acompanhou a cautela externa e encerrou a primeira sessão da semana em baixa de 0,41%, aos 124.519,38 pontos. O ajuste foi bem mais contido do que o observado em Nova York, onde as perdas chegaram a 4,00%, no Nasdaq, no fechamento. Na B3, o índice de referência oscilou dos 123.471,46 aos 125.031,30 pontos, correspondente ao nível de abertura. Com o Ibovespa em baixa desde o começo da sessão, o giro ficou em R$ 20,3 bilhões nesta segunda-feira. No primeiro terço do mês, o índice avança 1,40%, com ganho no ano a 3,52%.

No exterior, o dia foi de busca por proteção em ativos considerados seguros, ou mesmo livres de risco, como os Treasuries, o que resultou em queda dos rendimentos desses papéis. Aqui, o dólar fechou em alta de 1,07%, a R$ 5,8521 – com máxima no dia a R$ 5,8716 -, e a curva de juros doméstica também avançou, na margem. Na B3, muito poucas ações de primeira linha conseguiram se desvencilhar da aversão a risco, com destaque para Itaú (PN +0,89%), na máxima da sessão no fechamento. O dia também foi positivo para Eletrobras (ON +0,74%, PNB +0,75%). Na ponta ganhadora do Ibovespa, Magazine Luiza (+4,96%), Assaí (+3,97%) e JBS (+2,67%). No lado oposto, Brava (-5,72%), Hapvida (-5,53%) e Caixa Seguridade (-4,07%).

Em Nova York, além do Nasdaq, o Dow Jones e o S&P 500 encerraram o dia com perdas significativas – de 2,08% e 2,70%, respectivamente. “Trump minimizou essas oscilações e destacou que é importante focar no longo prazo, mesmo diante das dificuldades econômicas atuais”, diz Patrick Buss, operador de renda variável da Manchester Investimentos.

“As declarações do Trump lançaram ainda mais sombra sobre a economia global. Há preocupação crescente quanto ao rumo da política e da economia americana, com efeito mundial. Menção de recessão por uma figura política tão influente resultou em uma reação em cadeia”, resume Gabriel Cecco, especialista da Valor Investimentos. Decisões de consumo e investimento tendem a ser adiadas, e os preços dos ativos se tornam mais voláteis em contexto de incerteza maior, acrescenta o analista.

Além das dúvidas em torno da economia americana, foram divulgados dados da economia chinesa que evidenciaram processo deflacionário decorrente do menor consumo doméstico e dos fracos resultados do mercado de trabalho, diz Bruno Shahini, especialista em investimentos da Nomad. “Esse cenário negativo pressionou o preço das commodities, o que prejudica economias exportadoras como a brasileira, refletindo-se em termos de troca menos favoráveis e impactando diretamente a taxa de câmbio”, por exemplo, acrescenta Shahini.

Assim, neste começo de semana, o Ibovespa devolveu uma parte do que havia acumulado na semana anterior, quando avançou perto de 2%, descolado então dos mercados americanos, observa Alison Correia, analista e sócio da Dom Investimentos. “Hoje, o bom humor já não apareceu no nosso pregão”, acrescenta.

No Brasil, o destaque da agenda foi a divulgação do boletim Focus, em que os agentes de mercado ouvidos pelo Banco Central revisaram a projeção de inflação de 2025, elevada a 5,68%, destaca Buss, da Manchester, com a estimativa para 2026 mantida a 4,40% no levantamento desta semana – enquanto a Selic deve continuar em 15% para 2025 e cair a 12,5% no ano seguinte, aponta também a pesquisa.

Na B3, destaque nesta abertura de semana para ações do varejo, como Magalu, mesmo diante do avanço marginal observado na curva de juros doméstica na sessão. Segundo Buss, a ação de Magazine Luiza foi favorecida nesta segunda-feira após a empresa anunciar mudanças em sua estrutura para acelerar o crescimento da plataforma digital.

Juros

A aversão a risco global contaminou a curva de juros, que passou a abrir nesta tarde. O mercado entendeu que nem mesmo o presidente Donald Trump descartou o risco de uma recessão nos Estados Unidos, o que fez o dólar acelerar alta e, em efeito dominó, com impacto primeiramente nas taxas curta e intermediária – que são mais sensíveis à política monetária – pelo maior risco inflacionário. Mas o vértice longo também acabou acompanhando o movimento, com o mercado se ajustando para leilão do Tesouro amanhã.

Por volta das 17h20, taxa do contrato de DI para janeiro de 2026 subia a 14,785%, de 14,733% no ajuste anterior. A taxa para janeiro de 2027 avançava a 14,675%, de 14,586%, e a taxa para janeiro de 2029 aumentava para 14,630%, de 14,567%.

“O movimento hoje é global. A percepção de risco global piorou nesta tarde, então houve um aumento forte dos prêmios. Isso afeta o câmbio, e puxa os DIs”, afirma o economista-chefe da Western Asset, Adauto Lima. Ele vê o movimento como consequência da insegurança do mercado sobre a política tarifária do presidente Donald Trump, “que vai e volta”, com várias casas inclusive revisando as projeções para o crescimento dos EUA e aumentando a possibilidade de recessão, segundo ele.

Ao ser questionado sobre a possibilidade de recessão, Trump citou que a economia americana está em transição. “Essa declaração deu a entender que ele não descarta uma recessão nos EUA, então o mercado deu uma boa estressada”, explica o economista-chefe da Equador Investimentos, Eduardo Velho. Ele menciona que o índice do medo Vix, “que capta a incerteza do mercado”, chegou a saltar mais de 20%.

A apreciação do dólar, que fechou a R$ 5,85, leva à interpretação de maior risco inflacionário, o que pode tornar o trabalho do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) mais difícil à frente.

No âmbito político, hoje a nova ministra da Secretaria das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, direcionou-se ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em seu discurso de posse, e disse que pretende “ajudar na consolidação das pautas econômicas desse governo”, em um sinal de alinhamento com a agenda da equipe econômica.

Já o BC informou que adiou a publicação de dados fiscais de janeiro pela segunda vez, de 12 de março para 14 de março.

O mercado se prepara, ainda, para o leilão do Tesouro Nacional amanhã, que ofertará LFTs com vencimentos para 1º/3/2028 e 1º/3/2031, e NTN-Bs para 15/8/2030; 15/5/2035; e 15/8/2060. Com estresse no mercado externo, contudo, a perspectiva de alguns operadores de renda fixa é de que o Tesouro não oferte lotes grandes como fez nos primeiros dois meses do ano.
C

Deixe um comentário