Dólar volta a superar R$ 5,80 com preocupação fiscal e ruído político e Ibovespa cede quase 1%

O dólar encerrou a sessão desta quarta-feira, 26, com valorização de 0,86%, cotado a R$ 5,8035 – no maior nível de fechamento desde 3 de fevereiro (R$ 5,8160). O real apresentou o pior desempenho entre as principais moedas globais, incluindo divisas fortes e emergentes.

Além do sinal predominante de alta da moeda americana no exterior, o real sofreu com o aumento da percepção de risco inflacionário e fiscal, em meio a sinais reiterados de queda de popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Rumores em torno da reforma ministerial, que incluem o deslocamento de Fernando Haddad do ministério da Fazenda para a Casa Civil, contribuíram para o clima de incerteza.

O dólar até ensaiou um movimento tímido de queda na abertura, mas trocou de sinal após a primeira hora de negócios e ganhou impulso maior com o resultado do Caged, que revelou geração de empregos em janeiro bem acima das expectativas, e críticas do ministro do Trabalho, Luiz Marinho, à gestão da política monetária.

Por ora, a desaceleração da atividade esperada com o aperto monetário promovido pelo Banco Central ainda não se materializou, o que torna o controle da inflação mais desafiador. Há também temores de que, premido pela perda de popularidade, o governo adote mais medidas de estímulo ao consumo, o que pode se traduzir em mais pressões inflacionárias e piora do quadro fiscal.

“Se BC entrar na do mercado e elevar juros, vai inibir crescimento da economia em 2025. Espero que BC não cumpra a alta contratada em março”, afirmou Marinho, que classificou como “imbecilidade” conter o ritmo de atividade para controlar a inflação.

“O Caged foi visto como um sinal de possível pressão inflacionária. E as declarações de Marinho reforçam a percepção de que o governo vai adotar postura para combater a queda na aprovação, com uma política fiscal mais expansionista”, afirma a economista-chefe do Ouribank, Cristiane Quartaroli. “Isso acabou gerando um avanço maior do dólar aqui, colocando o real como destaque negativo entre as moedas emergentes.”

Marinho confirmou hoje que a medida provisória (MP) que libera os recursos do FGTS por quem optou pelo saque-aniversário será publicada na sexta-feira. A estimativa é de injeção de R$ 12 bilhões na economia. Já a MP do consignado privado deve sair na semana após o Carnaval.

O Citi avalia que a perda de popularidade de Lula provavelmente reflete o impacto negativo da inflação elevada, em especial a alta dos preços dos alimentos. “Olhando à frente, a principal preocupação em torno da baixa na popularidade de Lula é quanto o governo pode afrouxar a política fiscal tentando restaurá-la”, afirma o banco.

Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY ganhou força ao longo da tarde e se aproximou da linha dos 106,500 pontos, enquanto as taxas dos Treasuries aprofundaram a queda. A piora do humor veio na esteira da indicação de Donald Trump de que pretende aplicar tarifas a importações da União Europeia, com alíquotas de 25% sobre automóveis e outros produtos.

Por aqui, surgiram sinais de melhora no fluxo cambial. O BC informou que o saldo foi positivo em US$ 1,669 bilhão na semana passada, graças à entrada líquida de US$ 2,523 bilhões via comércio exterior. Contudo, em fevereiro, até o dia 21, o fluxo total ainda é negativo em US$ 666 milhões, por conta da saída de US$ 2,482 bilhões pelo canal financeiro. No ano, o fluxo total ainda tem saldo negativo de US$ 7,591 bilhões.

Ibovespa

Com dólar de volta à casa de R$ 5,80 no fechamento, em alta de 0,86% na sessão, o Ibovespa lutou até o fim, sem conseguir reter o nível de 125 mil pontos pelo terceiro dia seguido, hoje em viés negativo, em baixa de 0,96%, aos 124.768,71 pontos, com giro a R$ 22,2 bilhões. Na semana e no mês, o índice da B3 acumula perda de 1,86% e de 1,08%, respectivamente. No ano, limita o avanço a 3,73%.

Na sessão, o ajuste negativo foi puxado pelas ações de commodities e também pelas dos maiores bancos, com Bradesco em baixa de 1,21% (ON) e de 1,95% (PN). Vale cedeu 0,61%, na mínima do dia no fechamento, enquanto Petrobras encerrou sem sinal único, com a ON em baixa de 0,17% e a PN sem variação. Em relação à última sexta-feira, o Ibovespa amplia o ajuste, tendo encerrado a semana passada ainda na casa dos 127 mil pontos. Assim, no fechamento de hoje, foi ao menor nível desde 12 de fevereiro, então aos 124.380,21 pontos.

Na ponta ganhadora do Ibovespa hoje, Ambev (+5,50%), Metalúrgica Gerdau (+2,13%), Gerdau (+2,02%) e CSN (+1,87%). No lado oposto, IRB (-18,26%), WEG (-8,68%) – após balanço trimestral -, MRV (-7,84%) e Azul (-7,80%). O balanço do último trimestre de 2024 da Ambev, com lucro líquido de R$ 5,024 bilhões, e a distribuição de dividendos, divulgados pela manhã, ajudaram a colocar suas ações na lista de maiores ganhos do índice na sessão.

Para o CFO da Ambev, Lucas Lira, o lucro foi impulsionado pela combinação de crescimento do Ebitda e do resultado financeiro. “Essa combinação nos ajudou a compensar um aumento na linha de tributos”, afirmou o executivo em entrevista à jornalista Júlia Pestana, do Broadcast. Outro fator que ajudou a impulsionar o papel foi o anúncio da distribuição de dividendos intermediários de aproximadamente R$ 2 bilhões a serem pagos em abril.

No quadro mais amplo, o Ibovespa operou na defensiva, movido por leitura acima do esperado para a geração de empregos no Caged de janeiro, acendendo a luz para mais inflação com o mercado de trabalho ainda aquecido, observa Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos. “Mercado acredita que queda de popularidade do governo pode resultar em mais gastos públicos”, acrescenta. “Na agenda de resultados corporativos, atenção se volta para os números da Petrobras, que serão divulgados após o fechamento de hoje”, acrescenta.

Juros

As taxas intermediárias e longas de juros abriram mais de 30 pontos-base, com o mercado precificando o risco de que o governo Lula tente conter a queda de popularidade a partir de medidas que elevem o endividamento público. Já o estresse no vértice curto acompanhou a criação de empregos maior do que a esperada em janeiro, em tese propiciando inflação mais elevada. Operadores de renda fixa se preparam, ainda, para o leilão de prefixados do Tesouro amanhã, após a instituição mostrar queda de 13,51% no colchão de liquidez de dezembro para janeiro.

A taxa de depósito interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 subiu a 14,760%, de 14,595% no ajuste anterior. O DI para janeiro de 2027 avançou a 14,795%, de 14,475%, e o para janeiro de 2029 subiu a 14,815%, de 14,440% ontem no ajuste.

Na avaliação do economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, “a curva sobe precificando um país com endividamento maior” sob a perspectiva de que o governo Lula pode “buscar subterfúgio em expansão de gastos” para conter a queda de popularidade.

Potencializando preocupações com a inflação, os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostraram que o mercado de trabalho formal registrou um saldo positivo de 137.303 carteiras assinadas em janeiro de 2025, acima da mediana do Projeções Broadcast de criação de 50,5 mil vagas.

“Isso significa demanda adicional sobre a estrutura produtiva, que trabalha sem ociosidade e isso demandaria política monetária do Banco Central ainda mais contracionista”, afirma a economista-chefe da CM Capital, Carla Argenta. Ela destaca que a dinâmica inflacionária tem se mostrado sistematicamente elevada, acima da meta de inflação de 3%.

Durante coletiva de imprensa, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, afirmou que é uma “imbecilidade” inibir o crescimento da economia como forma de controlar a inflação. Ele também disse esperar que o BC não cumpra a alta na taxa Selic que já está contratada para março, de 1 ponto porcentual.

Operadores da renda fixa se preparam para o leilão de LTNs e NTN-Fs nesta quinta-feira. Para Sanchez, da Ativa, “o leilão não deve ser tão grande quanto o da semana passada – que foi histórico em termos de quantidade e volume financeiro -, considerando a abertura grande da curva”. Ele fundamenta a tese afirmando que quando a taxa do DI sobe expressivamente, o operador considera interessante ficar em títulos a taxas flutuantes, e não em prefixados.

Segundo o estrategista-chefe da Warren Investimentos, Sérgio Goldenstein, o volume grande de emissões do Tesouro visto nos dois primeiros meses de 2025 “faz sentido” dada a dinâmica de queda do colchão de liquidez do Tesouro Nacional desde o fim do ano passado.

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