Galípolo: cenário anda na direção que BC gostaria, talvez não tão rápido como gostaria

O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, afirmou nesta quinta-feira, 27, que o cenário anda na direção que a autoridade monetária gostaria, mas talvez não tão rápido quanto o desejado. “Os dados novos continuam apontando nessa direção que a gente comentou de que a política monetária está sim funcionando, mas funcionando de uma maneira bastante lenta, em uma economia que vem apresentando uma resiliência para o nível de restrição que a gente colocou na política monetária”, disse, em evento promovido pela Itaú Asset Management.

O banqueiro central reiterou que a estratégia atual é reunir dados e ganhar confiança nesse processo, sem se emocionar com dados específicos. “É um processo que vamos seguir dependente de dados. Quando dizemos que não estamos dando nenhum sinal para frente não é porque estamos querendo esconder alguma coisa, é porque eu realmente acho que a esperteza da comunicação que a gente teve ao longo desse ano foi ser humilde. A gente quer transparecer aquilo que efetivamente estamos vendo, com a limitação que temos, com o reconhecimento da complexidade que existe.”

Credibilidade

O presidente do Banco Central afirmou também que a credibilidade da autarquia não é resultado do trabalho de uma só pessoa, mas sim de uma construção coletiva. “Eu acho que essa questão da credibilidade e de você construir a questão da credibilidade da instituição não é minha, é da instituição. Ela nunca é resultado de uma personalidade ou de uma pessoa, ela é um processo de construção coletiva e ao longo do tempo”, disse.

O banqueiro central ponderou que nunca é simples ser o responsável pela autoridade monetária no Brasil, mas que não pode se queixar. “Eu me beneficio muito do trabalho que foi construído ao longo do tempo na instituição e dos técnicos da instituição. São técnicos muito bem capacitados e que sabem o que fazer.”

Variáveis macroeconômicas

Galípolo afirmou também que a autarquia, para além da surpresa nos números, tem observado surpresas na correlação das variáveis macroeconômicas no Brasil. “Se fôssemos perguntar para a maior parte das pessoas, especialmente para quem não é do Brasil, com uma taxa de juros nominal de 15%, com uma taxa de juros real alguma coisa entre 9% e 10%, você não imaginaria que o desemprego seguiria caindo como caiu e que iríamos bater o nível mais baixo”, disse.

Para Galípolo, esse “ruído” nas correlações macroeconômicas responde mais a uma situação estrutural do que conjuntural. “Não é de hoje que o Brasil tem as taxas de juros relativamente mais altas quando comparado com os seus pares, acho que o Banco Central deixou claro e vai continuar deixando claro que o fato de você ter uma condição estrutural que demanda você dar uma dose maior do remédio para fazer efeito.”

Apesar desse comportamento de algumas variáveis, Galípolo afirmou que, do ponto de vista do BC, a trajetória da inflação está em linha com o imaginado pela autarquia em seu “plano de voo”.

O banqueiro central afirmou também que os dados continuam demonstrando um processo de desaquecimento lento e gradual da economia brasileira. “Lógico que gostaríamos que a convergência da inflação fosse mais rápida, mas por outro lado, também afasta aquele outro risco de estar produzindo uma desaceleração muito abrupta na economia”, ponderou.

A autoridade voltou a repetir que o mandato do BC é produzir a convergência da inflação, e que para isso colocar a taxa Selic no nível que é necessário, pelo tempo que for necessário.

Também observou que, apesar do crescimento registrado pela economia, os ganhos de produtividade são menos evidentes do que o desejado para “sentir a confiança de que não estamos produzindo só crescimento”.

Cenário fiscal e expectativas desancoradas

O presidente do Banco Central avaliou que já há algum tempo, a percepção de um fiscal estimulativo está presente na expectativas desancoradas. Para o banqueiro central, essa questão pode explicar parte do gap existente entre as projeções do mercado e do BC.

Galípolo ponderou que nos últimos anos, medidas que foram apresentadas como neutras do ponto de vista do Orçamento e do resultado primário, na verdade, não foram necessariamente neutras do ponto de vista do impacto na demanda. “Se você está tributando mais e distribuindo renda para pessoas que têm uma propensão a consumir mais elevada, isso passa a ter um impacto diferente, que não é neutro, para fins de estímulo”, disse.

Eleições

O presidente do Banco Central afirmou ainda que anos de eleição podem apresentar uma maior volatilidade, em função das pesquisas eleitorais e questões que podem influenciar as expectativas. No entanto, frisou que o BC não faz juízo de valor sobre o que ele acha que será feito a partir da eleição.

“O BC segue naquela lógica de que ele não faz juízo de valor sobre o que acha que será feito a partir da eleição, e, sim, como é que isso está afetando o que é o nosso mandato efetivamente, como está afetando a demanda, inflação corrente e expectativas”, emendou ele.

Galípolo afirmou a importância da meta de inflação contínua justamente em momentos como esse. “Ela é importante porque formaliza o que é operacional do BC, que é: ele já está olhando para um horizonte que perpassa o ano eleitoral e, lógico, qualquer fator novo”, disse.

O banqueiro central, na sequência, frisou que o BC segue vigilante e sempre fará os ajustes que forem necessários. “O BC jamais vai se furtar de fazer o ajuste que for necessário em função dos fatos que podem ocorrer.”

Crédito

Galípolo disse também que o mercado de crédito brasileiro continua crescendo “de maneira bastante surpreendente”, dado o nível da taxa Selic, de 15% ao ano. Segundo ele, isso demanda “vigilância e conservadorismo” na condução da política monetária.

“A gente ainda segue com esse canal, que é o canal por excelência de transmissão da política monetária, apresentando ainda um impulso e um crescimento que é relevante e que demanda essa vigilância do Banco Central”, comentou o presidente do BC.

Funding imobiliário

O presidente do Banco Central disse que o novo modelo de funding imobiliário, lançado pelo governo em outubro, tende a aumentar a potência da política monetária. Ele citou a medida como uma das ações destinadas a reduzir subsídios e distorções que bloqueiam o canal de transmissão dos juros, e levam o País a ter taxas consistentemente mais altas do que pares.

“A intenção foi pegar algo que já vinha sendo desenhado desde a época em que o Bruno estava lá, de como a gente poderia utilizar ainda mais a poupança para suavizar a transição para um financiamento que vai ser mais adequado, para que a captação tenha um casamento maior com o ativo, e para taxas que vão gradativamente se aproximar das taxas de mercado, o que tende a aumentar a potência da política monetária”, disse o banqueiro central.

Na fala, Galípolo se referia a Bruno Serra, ex-diretor de Política Monetária do BC e atualmente gestor da Itaú Asset, responsável por conduzir a entrevista.

Desde o início da sua gestão, no começo deste ano, Galípolo vem repetindo que a “normalização” da política monetária é uma das agendas essenciais para o BC. Nesta quinta-feira, ele repetiu que esse processo vai demandar uma série de reformas, sendo que nem todas estão na alçada da autoridade monetária. O presidente da autarquia disse que essa é uma das agendas nas quais gostaria de avançar nos próximos três anos de mandato.

O banqueiro central também citou como uma medida para “normalizar” a política monetária o aumento da colateralização, com o objetivo de reduzir os juros do crédito pessoal. Como as taxas dessas modalidades normalmente são múltiplos da Selic, variações na taxa básica têm impacto limitado. Ele observou que o Drex deve servir como uma plataforma para dar liquidez a ativos e permitir seu uso como garantias, e não como uma moeda digital de um banco central (CBDC, na sigla em inglês).

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Por Redação Folha de Guarulhos.

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