O secretário-executivo do Ministério da Justiça durante o último ano de governo Jair Bolsonaro, Antonio Ramirez Lorenzo, disse, em depoimento ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira, 28, se arrepender de publicações nas redes sociais, recomendou que plataformas não sejam usadas como “arena pública” e mencionou que é melhor “guardar opiniões para si”.
Lorenzo foi testemunha do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, réu na ação penal que investiga tentativa de golpe de Estado. A declaração foi dada após o relator, ministro Alexandre de Moraes, resgatar as publicações feitas por ele em plataformas digitais.
Lorenzo chamou o então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, de “adolescente metido a influencer” e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de “vergonha nacional” poucas horas depois de manifestantes vandalizarem Brasília, em dezembro de 2022.
“Foi no calor da emoção”, justificou Lorenzo, nos dois casos. O ex-secretário-executivo, então, afirmou que era melhor “guardar opiniões para si”.
Antonio Ramirez Lorenzo fez uma crítica em uma rede social após Flávio Dino, que àquele momento iria substituir Torres no Ministério da Justiça, dar uma coletiva de imprensa pouco tempo após vândalos tentarem depredar a sede da Polícia Federal.
Para Lorenzo, Dino fez um “estardalhaço”. “Assim funciona a esquerda… não é governo, não tem poder nem autoridade alguma sobre a matéria, mas convoca coletiva, faz estardalhaço e, como sempre, sem resultado prático algum… Brasil rumo a um buraco vergonhoso… Lula vergonha nacional”, escreveu Lorenzo, sem condenar os ataques.
Moraes lembrou dessa publicação após perguntá-lo se houve uma “transição técnica” no Ministério da Justiça entre Torres e Dino.
No depoimento, o brigadeiro do ar disse que a transição no Ministério da Justiça foi feita de forma “decente”. Ele também comentou sobre a live de 2021 em que Bolsonaro, ao lado de Torres, fez ataques sem provas às urnas eletrônicas.
Lorenzo disse que ficou “bastante assustado” quando o chamamento veio para o então ministro participar da live. “Quando recebi esse telefonema fiquei bastante assustado”, afirmou o ex-auxiliar de Torres. “Não valia a pena mexer com isso, era bastante complicado. Não havia indisposição de Anderson em relação às urnas, são um fator moderno, tecnológico interessante e não havia comprovação que desacreditasse as urnas.”
O plano discutido internamente, afirmou Lorenzo, foi de tentar expor o ministro o mínimo possível na live e trazer um conteúdo “essencialmente técnico, que pudesse ser dito sem maior comprometimento, já que era um tema sensível”.
Também, segundo ele, a equipe da pasta até tinha a expectativa que a live acabasse sem que o ministro aparecesse.
“Curiosamente, quase por muito pouco, ele não participou”, disse Lorenzo. “O presidente chegou a ensaiar que ia encerrar a live – isso não deve aparecer nas câmeras, mas um assistente rastejou pela mesa, o cutucou e disse que o ministro estava do lado de fora com o relatório em mãos.”
Durante as oitivas no STF, a defesa de Anderson Torres busca tirar das testemunhas que não houve a intenção do ex-ministro em atacar as urnas, que ele teria sido “convocado” por Bolsonaro a participar da transmissão – outros dois depoentes já disseram isso.
Além disso, os advogados resgatam uma reunião em que a Procuradoria-Geral da República (PGR) apontou que seria o encontro que definiu o maior número de blitze da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no Nordeste do Brasil durante o segundo turno da eleição presidencial, em 2022. Para a defesa, não houve plano para favorecer Lula ou direcionamento das operações.
Lorenzo foi mais uma testemunha que corroborou essa versão da defesa. “Havia uma preocupação muito grande contra crimes eleitorais, assim como houve no primeiro turno. A operação é contra crime eleitoral”, afirmou. “O ministro Anderson sempre demonstrou isenção, separação entre o que era ação do ministério e o que era preferência pessoal.”
‘Vamos nos ater aos fatos’, diz Moraes para testemunha
Moraes também chegou a repreender Lorenzo durante a audiência. O brigadeiro disse que, se não tivesse passado pela experiência no Ministério da Justiça, poderia acreditar que houve tentativa de golpe. “Responda aos fatos. Se você acha ou não que teve golpe, isso não é importante para a Corte. Vamos nos ater aos fatos”, retrucou.
Os depoimentos desta quarta-feira foram breves. Apenas outra testemunha foi ouvida: Rosivan Correia de Souza, coronel da Polícia Militar do Distrito Federal.
Moraes: ‘Secretário de Segurança é uma rainha da Inglaterra aqui?’
Durante a audiência do coronel, Moraes também ironizou uma parte em que ele e a defesa de Anderson Torres disseram que a PM do DF não estava “subordinada”, mas “vinculada” à Secretaria de Segurança Pública.
“Aqui no Distrito Federal existe uma vinculação da Polícia Militar à SSP. Não há subordinação”, afirmou Rosivan. “Então, o secretário de Segurança é uma rainha da Inglaterra aqui?”, questionou Moraes, que lembrou do cargo que exerceu como secretário de Segurança Pública.
“Dizer que a secretaria de Segurança não exerce a hierarquia sobre as polícias é querer dizer que o presidente da República não é o chefe das Forças Armadas”, disse o ministro.