Dólar cai 2,71% e volta para R$ 5,75 com alívio em tarifas e Fed no radar

Em sessão reduzida na volta do Carnaval, o dólar à vista caiu mais de 2,5% e voltou a fechar abaixo de R$ 5,80, acompanhando a onda de enfraquecimento da moeda americana no exterior. O real apresentou o melhor desempenho entre as principais moedas globais, refletindo também os movimentos dos dois últimos dias, quando o mercado local esteve fechado.

Investidores reagem à perspectiva de queda maior de juros pelo Federal Reserve neste ano, após dados aquém do esperado do mercado de trabalho, e a sinais mais amenos de Donald Trump em relação a tarifas. A retomada das negociações entre EUA e Ucrânia para entendimento sobre exploração de minerais, considerado um prenúncio para um acordo de paz, também contribuiu para o recuo do dólar.

Os ruídos políticos domésticos provocados pela indicação da presidente do PT, Gleisi Hoffman, para a Secretaria de Relações Institucionais (SRI) no fim da semana passada ficaram em segundo plano. A ascensão de Gleisi ao posto de articuladora política do governo, aliada ao mal-estar provado pelo bate-boca entre Trump e o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, levaram o dólar a superar R$ 5,90 na última sexta-feira.

Com início dos negócios às 13h nesta Quarta-Feira de Cinzas, o dólar abriu em queda firme e já recuava mais de 2% antes da primeira meia hora de pregão. Com mínima a R$ 5,7525, a moeda fechou a R$ 5,7560, em baixa de 2,71%, após ter avançado 3,24% na semana passada. No ano, a divisa acumula desvalorização de 6,86%.

Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis moedas fortes, o índice DXY caiu mais de 1%, furando o piso dos 105,000 pontos, com mínima aos 104,259 pontos no fim da tarde. Destaque para a baixa de mais de 1,5% em relação ao euro, diante do aumento dos gastos da União Europeia em defesa.

Relatório ADP mostrou que o setor privado dos EUA gerou 77 mil empregos em fevereiro, bem abaixo das expectativas (143 mil). As atenções se voltam agora ao relatório oficial de emprego (payroll) na sexta-feira, 7. De outro lado, dados do setor de serviços e de encomendas à indústria vieram melhores que o esperado.

Monitoramento de ferramenta do CME Group mostram chances superiores a 30% de corte de 75 pontos-base na taxa básica americana neste ano, com junho despontando como o mês mais provável para a redução inicial, com mais de 80% de probabilidade.

“A mudança de narrativa deu força para as moedas emergentes, já que agora se espera que o Fed implemente medidas de alívio mais abrangentes do que o Banco Central Europeu nos próximos 12 meses”, afirma, em nota, a economista-chefe da gestora americana VanEck, Natalia Gurushina, acrescentando que os adiamentos de última hora em imposição de tarifas também “estão ajudando” os mercados emergentes.

À tarde, o secretário de Comércio dos EUA, Howard Lutnick, disse em entrevista a Fox News que Trump está inclinado a excluir o mercado do Acordo Estados Unidos-México-Canadá (USMCA, na sigla em inglês) do processo de aumento de tarifas. Em seguida, contudo, Trump comentou que os esforços do Canadá para conter o contrabando de fentanil aos EUA ainda não são “bons o suficiente”. A Casa Branca informou que Trump vai conceder prazo de 1 mês para aplicação de tarifas apenas a veículos da USMCA.

O economista André Galhardo, consultor econômico da plataforma de transferências Remessa Online, destaca que o DXY já acumula queda de 3% em março, o que favorece as moedas emergentes, com destaque para o real e o peso chileno.

Galhardo atribui parte desse movimento a um possível acordo de cessar-fogo na Ucrânia, com sinais de reaproximação entre Trump e Zelensky, após o entrevero no Salão Oval da Casa Branca na semana passada. O presidente ucraniano disse hoje que as equipes dos dois países estão reunidas e que é possível ver o resultado das conversas já na próxima semana.

“Outro fator que contribui para a valorização as moedas emergentes são os dados recentes da economia americana. Apesar de desempenho levemente acima das projeções, eles sinalizam desaceleração entre janeiro e fevereiro”, afirma Galhardo. “Isso abre espaço para que o Fed reduza os juros em junho e realize mais dois cortes no segundo semestre, caso os impactos das tensões comerciais sobre preços não sejam imediatos ou significativos.”

Ibovespa

Em sessão mais curta após a pausa do carnaval, o Ibovespa manteve margem estreita, de 617 pontos entre a mínima (122.747,06) e a máxima (123.364,03) da sessão, com giro a R$ 20,2 bilhões. Ao fim, apesar do mergulho de Petrobras (ON -4,61%, PN -3,65%), o índice da B3 mostrava leve ganho de 0,20%, aos 123.046,85 pontos, nesta abertura de março, vindo de perda de 1,60% na sessão anterior. No ano, sobe 2,30%.

Na retomada dos negócios nesta quarta de cinzas, 5, a pressão colocada por Petrobras sobre o Ibovespa foi mais do que compensada pela alta de 0,80% em Vale ON e de 1,43% (Santander Unit, máxima do dia no fechamento) a 2,05% (Bradesco PN) entre os papéis das principais instituições financeiras, o setor de maior peso no índice. Na ponta ganhadora, Embraer (+8,79%), Marfrig (+7,04%) e Ambev (+4,58%). No lado oposto, Brava (-8,27%), Automob (-4,00%) e Ultrapar (-3,79%), além de Petrobras.

“Petrobras, Prio (-2,10%) e Brava tiveram queda expressiva”, com o petróleo em retração pela quarta sessão consecutiva, aponta Luise Coutinho, head de produtos e alocação da HCI Advisors, mencionando a preocupação dos investidores ante a confirmação dos planos da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) de levar adiante a elevação da produção em abril – além de o Departamento de Energia dos EUA ter informado que os estoques da commodity aumentaram na semana.

Dessa forma, o contrato da referência americana para abril, o WTI, caiu hoje 2,85%, a US$ 66,31 por barril, em Nova York, enquanto, em Londres, a referência global, o Brent, cedeu 2,44%, a US$ 69,30 por barril, nos contratos para maio.

Como pano de fundo global neste meio de semana, os investidores também ponderam as tarifas impostas pelo presidente americano, Donald Trump, a Canadá, China e México – o que contribui para o reforço das tensões comerciais, destaca a analista. Ainda assim, em Nova York, os principais índices de ações renovaram máximas do dia em paralelo à divulgação do Livro Bege, sumário das condições econômicas regionais nos Estados Unidos, reportado pelas distritais do Federal Reserve, o BC americano.

O levantamento mostrou leve aumento na atividade econômica em janeiro nos EUA, mas sinalizou, também, gastos do consumidor mais baixos e ampliação no ritmo de elevação dos preços em vários distritos. No fechamento, Dow Jones +1,14%, S&P 500 +1,12% e Nasdaq +1,46%.

“A percepção é de que o Brasil saiu de alguma forma beneficiado nesse primeiro momento, depois das tarifas, porque não foi onerado. Relação com os Estados Unidos pode sair até fortalecida, o que se refletiu por aqui na queda do dólar frente ao real”, diz Virgílio Lage, especialista da Valor investimentos. O Brasil é um dos raros parceiros comerciais dos Estados Unidos com o qual o país do norte mantém superávit. Assim, o dia foi não apenas de leve alta para a Bolsa brasileira como também de forte retração no câmbio – com o dólar em queda de 2,71%, a R$ 5,7560 – e de ajuste de baixa na curva de juros doméstica. “Não fosse Petrobras e o petróleo, o Ibovespa teria um desempenho bem melhor na sessão”, ressalta.

Conforme relato da Bloomberg, o governo dos EUA considera adiar em um mês as tarifas impostas às montadoras de México e Canadá, disseram fontes. Segundo algumas delas, funcionários da gestão Trump se reuniram na terça-feira para discutir o assunto com os líderes da Ford, General Motors e Stellantis. Outra reunião sobre o possível alívio tarifário estava marcada para esta quarta-feira na Casa Branca, disseram as fontes.

“De certa forma, o mercado tem mostrado resiliência, mas sem propulsão para uma guinada”, observa Jonatas Faura, especialista em alocação de ativos na WIT Invest. “Na primeira quinzena de fevereiro, o Ibovespa até se beneficiou de queda do dólar, mas, na última semana do mês, o dólar voltou a subir”, acrescenta. Ele destaca as expectativas para o Copom – que deve voltar a elevar a Selic em março – além das incertezas internas e externas, que dificultam que o Ibovespa encontre forças para um avanço sustentado – o que faz com que o índice da B3 “patine” na faixa de 125 mil a 128 mil pontos, diz Faura.

Juros

Deixe um comentário