O dólar apresentou queda firme nesta quinta-feira, 5, e voltou a fechar abaixo do nível de R$ 5,60 pela primeira vez desde meados de outubro. Divisas emergentes e de países exportadores de commodities avançaram, apoiadas em dois pontos: novo sinal de perda de força do mercado de trabalho dos EUA, que reforça a expectativa de corte de juros pelo Federal Reserve neste ano, e a possibilidade de arrefecimento da guerra comercial, após telefonema entre o presidente norte-americano, Donald Trump, e o líder chinês, Xi Jinping.
O real foi um dos destaques entre as divisas mais líquidas, seguido de perto pelo peso chileno. Operadores e analistas ouvidos pelo Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) atribuem o desempenho da moeda brasileira à expectativa pelo anúncio das expectativas fiscais no fim de semana e ao aumento das apostas em alta da taxa Selic em 0,25 ponto em junho, o que aumenta a atratividade do carry trade.
Um ala do mercado também atribui parte do fortalecimento do real a sondagens que mostram enfraquecimento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e às chances de vitória de um candidato mais à direita do espectro político, em tese mais comprometido com a austeridade fiscal, no pleito de 2026.
O dólar à vista rompeu o piso de R$ 5,60 logo após a primeira hora de negócios e, após registrar mínima a R$ 5,5787, encerrou a sessão em queda de 1,08%, a R$ 5,5845 – menor valor de fechamento desde 14 de outubro (R$ 5,5827). A moeda já acumula baixa de 2,36% nos quatro primeiros pregões de junho, o que leva as perdas no ano a 9,64%.
À tarde, a notícia de que a S&P Global Ratings manteve o rating do Brasil em BB, com perspectiva estável, não teve influência aparente na formação da taxa de câmbio. Na semana passada, a Moody’s havia alterado a perspectiva da nota brasileira de positiva para estável, enterrando as chances de o país conquistar o grau de investimento no curto prazo.
O economista-chefe da Equador Investimentos, Eduardo Velho, afirma que os indicadores mais recentes dos EUA, como os pedidos semanais de auxílio-desemprego, divulgados nesta quinta, mostram arrefecimento da economia americana e levam a uma queda do dólar. Além disso, a conversa entre Trump e Xi Jinping, embora não traga nada concreto, é positiva ao mostrar disposição para negociações.
“O mercado já começa a especular que há espaço para que o Fed corte os juros neste ano em mais do que os 50 pontos-base já esperados. É um ambiente que estimula queda do dólar em relação a divisas emergentes”, afirma Velho, lembrando que investidores já podem ter se posicionado nesta quinta à espera da divulgação, na sexta, do relatório de emprego (payroll) de maio. “O Fed se mantém cauteloso, mas o mercado mostra certo otimismo”.
Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY operou ao redor da estabilidade e rondava os 98,700 pontos no fim do dia. A moeda americana subia, contudo, em relação ao franco suíço e ao iene, duas divisas vistas como refúgio em momentos de aumento da aversão ao risco. Tirando o rublo russo, com ganhos de mais de 2,5%, o real apresentou o melhor desempenho entre as moedas mais líquidas.
Para o superintendente da Mesa de Derivativos do banco BS2, Ricardo Chiumento, a queda mais forte do dólar por aqui está relacionada ao aumento das apostas no mercado de juros futuros de uma alta final da taxa Selic em 0,25 ponto porcentual, para 15%, pelo Copom neste mês.
“Não vejo fundamento para o dólar ficar abaixo de R$ 5,60. O que favorece o real neste momento é um movimento em cima do aumento do carry trade, que atrai recursos de estrangeiros”, diz Chiumento, que vê com ceticismo a perspectiva de que o governo anuncie medidas estruturais do ponto de vista fiscal em substituição ao aumento do IOF.
Ibovespa
O Ibovespa emendou um segundo dia de perdas, hoje de 0,56%, aos 136.236,37 pontos, com giro a R$ 22,1 bilhões. Na semana e no mês, cede agora 0,58%, ainda sustentando ganho de 13,26% no ano. Entre a mínima e a máxima, o índice oscilou de 136.030,75 a 137.451,31 pontos, saindo de abertura aos 137.002,83. No meio da tarde, o aprofundamento de perdas em Bradesco (ON -2,75%, PN -2,92%) e Itaú (PN -1,22%) contribuiu para que o Ibovespa fosse às mínimas da sessão, sem contudo perder o patamar dos 136 mil no pior momento do dia. O nível de fechamento hoje, contudo, foi o mais baixo desde 8 de maio, há quase um mês.
Por outro lado, Vale ON mostrou ganhos acomodados no fechamento, em alta muito moderada a 0,27%, reduzindo assim o suporte para o índice da B3. Por sua vez, Petrobras fechou o dia sem direção única, com a ON em baixa de 0,54% e a PN, praticamente sem variação (+0,03%). Na ponta ganhadora, destaque para Suzano, em alta de 6,31%, à frente de Minerva (+4,90%) e de RD Saúde (+3,10%). Destaque também, no setor de metais, para Gerdau (+3,47%) e para Metalúrgica Gerdau (+3,15%). No lado oposto, Hapvida (-5,92%), Cogna (-3,81%) e Vivara (-3,74%).
“Um dia com alguns destaques importantes nos Estados Unidos, com pedidos de auxílio-desemprego semanais um pouco piores do que o esperado, o que reforça a expectativa para o relatório oficial sobre o mercado de trabalho, amanhã. Houve também contato entre os presidentes Donald Trump (EUA) e Xi Jinping (China), e retomada do diálogo é importante para que se reduzam os ruídos em torno das tarifas comerciais. Na agenda doméstica, não houve novidades sobre a questão do aumento do IOF, com um pouco mais de foco na agenda externa na sessão”, diz Rodrigo Ashikawa, economista da Principal Asset Management no Brasil.
Kevin Oliveira, sócio e advisor da Blue3, reforça que alguns indicadores de atividade dos Estados Unidos têm refletido os efeitos do tarifaço americano. “A pesquisa da ADP sobre a geração de emprego no setor privado, divulgada ontem, mostrou menos vagas do que o esperado para maio. O que também eleva a expectativa para a divulgação do relatório oficial sobre o emprego, o payroll, nesta sexta-feira”, acrescenta.
Em Nova York, os rendimentos dos Treasuries avançaram nesta quinta-feira, e os principais índices de ações fecharam em baixa de 0,25% (Dow Jones), 0,53% (S&P 500) e 0,83% (Nasdaq).
Juros
Os juros futuros tiveram alta firme nesta quinta-feira, em meio à crescente percepção de que o Comitê de Política Monetária (Copom) pode não ter encerrado em maio o ciclo de aperto da Selic e ainda acompanhando a tendência de avanço nas curvas globais. A aposta de elevação da taxa básica em junho passou a ser majoritária e também ganhou força para o Copom de julho. Lá fora as taxas subiram, com o mercado de olho na sinalização do Banco Central Europeu (BCE) após a decisão de reduzir sua taxa de juros para 2%.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 fechou em 14,910%, de 14,821% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2027 subiu de 14,21% para 14,36%. O DI para janeiro de 2029 encerrou com taxa de 13,79% (de 13,62%) e a do DI para janeiro de 2031 avançou de 13,76% para 13,93%.
A aposta de manutenção da Selic nos atuais 14,75% no Copom de junho parecia consolidada até dias atrás, mas veio perdendo força nas últimas sessões, especialmente a partir da leitura dos números do Caged e da Pnad Contínua de abril, num ambiente de estímulo fiscal via consignado privado.
Segundo o gestor de renda fixa da Porto Asset, Gustavo Okuyama, dentro desse contexto de indicadores mais fortes da atividade, há também percepção de que os diretores do Banco Central estão com uma postura mais cautelosa, em recentes reuniões com participantes do mercado, “o que conversa um pouco com a postura que a gente observou do Galípolo segunda-feira”.
Na segunda-feira, em evento em São Paulo, Galípolo reiterou que o momento é de cautela e que a autoridade monetária esperará as informações da economia para definir se a taxa de juros está suficientemente contracionista. “Seguimos em uma economia que tem apresentado uma resiliência surpreendente”, disse.
Na curva do DI, o economista-chefe do banco Bmg, Flávio Serrano, informou que a precificação para a reunião de junho é de 18 pontos-base, ou seja 72% de chance de aumento de 25 pontos e 28% de probabilidade de Selic estável. Ontem, a chance de manutenção era de 52% e a de avanço de 25 pontos, de 48%. A curva voltou a apontar Selic terminal nos 15%, mais precisamente em 15,10%.
O economista-chefe da Terra Investimentos, João Mauricio Rosal, acrescenta as preocupações com o lado fiscal no rol de fatores a deixar o mercado mais cauteloso, embora hoje não tenham surgido notícias concretas sobre as alternativas ao aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). “O noticiário recente é preocupante. Haddad parece estar catando migalhas, tentando angariar receitas não recorrentes. Não à toa cresceu a possibilidade de nova alta da Selic”, disse.
O exterior também pesou na curva longa, com as indicações do BCE no radar. “O Banco Central Europeu reduziu o juro em 25 pontos-base, mas adotou uma postura mais ‘hawk’, mais preocupada com efeitos das tarifas na inflação, com o pacote alemão de gastos. O mercado está revendo o que vai ser o ciclo monetário por lá. Temos hoje um movimento global de taxas de juros pressionadas, desde a Europa, emergentes de forma geral, com um ‘price action’ muito similar de juros pressionados e a moeda resiliente”, argumenta Okyuama.