Com inflação e Fux, Ibovespa se reaproxima de recorde, perto dos 143 mil pontos

Em dia de leituras deflacionárias sobre índices de preços tanto no Brasil (IPCA) como nos Estados Unidos (PPI, a métrica do atacado), ambos referentes a agosto, o Ibovespa ganhou fôlego e, pela terceira vez nas últimas quatro sessões, tocou no intradia, sem conseguir sustentar no fechamento, a marca inédita dos 143 mil pontos. Assim, ficou bem perto de renovar a recente máxima histórica de encerramento (do dia 5), nesta quarta-feira, 10, aos 142.348,70 pontos, em alta moderada a 0,52%, e com giro a R$ 18,8 bilhões nesta Quarta-feira.

No melhor momento, foi aos 143.181,59 pontos, saindo de mínima na abertura aos 141.611,77 pontos. Na semana, em três sessões, ainda cede 0,20%, com ganho no mês a 0,66% e, no ano, a 18,34%.

Para além da agenda econômica, o voto divergente do ministro Luiz Fux, na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), deu fôlego à expectativa de que o desenlace do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros sete réus por tentativa de golpe de Estado após a derrota eleitoral de 2022 venha a resultar em neutralidade da Casa Branca. Na terça, por meio da porta-voz, a Presidência dos EUA chegou a indicar que países que ferem a liberdade de expressão – como alega ser o caso no Brasil, com o julgamento do STF – estão sujeitos não apenas ao emprego de mecanismos econômicos – leiam-se tarifas comerciais – como também à ação militar.

Em Londres e Nova York, em meio à retomada de tensões no Oriente Médio desde o inédito ataque, na terça, de Israel ao Catar – outro aliado dos EUA na região -, os preços do petróleo seguiram pressionados nesta quarta-feira, em alta de 1,6% na sessão, o que favoreceu as ações de Petrobras (ON +2,56%, PN +1,81%) na B3. Foi o terceiro dia consecutivo de ganhos para as cotações da commodity no exterior.

Vale ON também fechou no positivo, em alta de 0,69%, assim como a maioria dos grandes bancos à exceção de Bradesco (ON -0,83%, PN -0,71%). Destaque para a recuperação vista em Banco do Brasil (ON +3,04%), instituição financeira pública tida como alvo preferencial da Casa Branca em eventuais novas sanções – hipótese que perde força, no momento, com a quebra de consenso pela condenação de Bolsonaro, por meio do voto dissidente do ministro Fux nesta quarta-feira.

Na ponta ganhadora do Ibovespa, C&A (+4,80%), Marfrig (+4,17%) e Magazine Luiza (+3,70%), à frente de Banco do Brasil. No lado oposto, MRV (-4,83%), Braskem (-3,69%), Suzano (-2,14%) e Klabin (-1,81%). “Na sessão, a deflação pelo IPCA favoreceu, obviamente, empresas com exposição à taxa de juros, como as de varejo C&A e Magazine Luiza, bem como alguns nomes do setor de construção, como Cyrela (em alta de 1,68% no fechamento)”, diz Patrick Buss, operador de renda variável da Manchester Investimentos.

Na agenda econômica doméstica, destaque pela manhã para o IPCA de agosto, com deflação um pouco inferior à aguardada para o mês. Nos núcleos, contudo, a leitura não pareceu tão benfazeja, observa Camilo Cavalcanti, gestor de portfólio na Oby Capital. “Nos núcleos, a sinalização é mais preocupante. A média ficou em 0,31%, acima de julho e também do esperado para agosto, mostrando que a inflação subjacente segue resiliente, interrompendo a melhora dos últimos meses. O maior destaque negativo foram os itens intensivos em trabalho que vieram com alta de 0,65%”, acrescenta.

Dessa forma, na semana que antecede a deliberação do Comitê de Política Monetária (Copom) sobre a Selic, a inflação oficial de agosto não tende a alterar a perspectiva e os sinais do BC sobre os juros básicos, hoje a 15% ao ano. “O Banco Central deve adotar cautela na condução dos cortes da Selic. Embora os preços administrados e itens voláteis, como combustíveis e energia, sigam trazendo alívio, a persistência da inflação de serviços e a difusão elevada reforçam a necessidade de uma condução cuidadosa”, diz Cavalcanti.

Por outro lado, nos Estados Unidos, a leitura deflacionária da inflação ao produtor (PPI) em agosto, em retração de 0,1% na margem – quando a expectativa de consenso era de que haveria alta de 0,4% no mês – contribui para manter sobre a mesa, na semana que vem, a expectativa do mercado de que o Federal Reserve inicie, de fato, o ciclo de afrouxamento da política monetária por lá, aponta Willian Queiroz, sócio e advisor da Blue3 Investimentos.

“Mercado doméstico está firme, sem correções mais profundas, o que chamou atenção também neste pregão. O próximo passo será acompanhar a evolução da curva de juros e, principalmente, a decisão do Federal Reserve sobre as taxas de referência dos Estados Unidos na semana que vem. Caso haja entrada de fluxo estrangeiro para ações brasileiras, a Bolsa tende a ganhar novo impulso”, diz Alexandre Pletes, head de renda variável da Faz Capital.

Dólar

O dólar apresentou queda firme nesta quarta-feira, 10, e chegou a operar pontualmente abaixo do nível técnico de R$ 5,40. Segundo operadores, o real acompanhou a valorização de divisas emergentes, em especial ligadas a commodities, após leitura mais fraca da inflação ao produtor nos Estados Unidos.

Também teria contribuído para a baixa do dólar a redução de temores de novas sanções americanas ao Brasil no curto prazo, após a divergência aberta pelo ministro Luiz Fux no julgamento do ex-presidente da República Jair Bolsonaro na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF).

A deflação de 0,11% do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em agosto, menor que a mediana de Projeções Broadcast (-0,16%), não teve impacto relevante na formação da taxa de câmbio, embora tenha esfriado as apostas em corte da taxa básica de juros (Selic) em dezembro.

Com mínima de R$ 5,3991, registrada no início da tarde, o dólar à vista fechou em queda de 0,54%, a R$ 5,4069. A desvalorização em setembro é de 0,28%, após recuo de 3,19% em agosto. No ano, as perdas somam 12,51%, o que faz do real a divisa latino-americana de melhor desempenho em 2025.

Em voto marcado por indiretas ao ministro Alexandre de Moraes, Fux afirmou que o julgamento de Bolsonaro não é da alçada do Supremo, porque os fatos ocorreram quando o político já havia deixado a presidência. Além disso, acolheu o argumento de cerceamento de defesa. O ministro defendeu a “nulidade absoluta” do processo.

O gestor Eduardo Aun, da AZ Quest, diz que, embora considere certa a condenação de Bolsonaro, o mercado acompanha a possibilidade de recursos que posterguem a decisão definitiva. Ao defender que o STF não é o palco para julgar o ex-presidente, Fux pode ter aberto espaço para manobras da defesa.

“O tempo para a condenação é uma variável importante. Se a decisão for postergada, com a equipe de Bolsonaro entrando com recurso, uma eventual resposta dos EUA com novas sanções também vai demorar mais”, afirma Aun, ressaltando que as apostas na corrida eleitoral de 2026 também permeiam os negócios.

“O nome de Tarcísio aparece com força. O mercado está de olho em uma mudança na política fiscal em caso de uma vitória da oposição. Fatos que fortaleçam a direita tendem a impulsionar os ativos domésticos”, diz o gestor, em referência ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).

À tarde, o Banco Central (BC) informou que o fluxo cambial está positivo em US$ 277 milhões no mês até o dia 5, com entrada líquida de US$ 743 milhões via comércio exterior e saída líquida de US$ 466 milhões pelo canal financeiro. No ano, até 5 de setembro, o fluxo total é negativo em US$ 16,627 bilhões, devido à retirada líquida de US$ 53,480 bilhões do lado financeiro.

“O fluxo está ruim desde o começo do ano, mas o carrego é muito elevado e o dólar se enfraquece globalmente. Pode cair ainda mais com uma redução dos juros nos EUA”, afirma Aun, que vê possibilidade de dois ou três cortes pelo Federal Reserve até dezembro.

No exterior, o índice DXY, que mede o dólar ante uma cesta de seis divisas fortes, rondava a estabilidade no fim da tarde, na casa dos 97,800 pontos, após mínima de 97,595 pontos pela manhã.

O índice de preços ao produtor (PPI, na sigla em inglês) caiu 0,1% em agosto, ante expectativa de alta de 0,4%. Na comparação anual, houve avanço de 2,6%, abaixo da projeção de 3,3%. O núcleo do PPI – que exclui itens mais voláteis – também surpreendeu ao registrar queda de 0,1% na margem, quando se estimava aumento de 0,3%.

Investidores aguardam a divulgação na quinta-feira, 11, da inflação ao consumidor nos EUA em agosto para calibrar as apostas em torno da magnitude de afrouxamento monetário no país daqui até o fim do ano. Já é dado como certo que o Federal Reserve vai cortar a taxa básica no próximo dia 17, em pelo menos 25 pontos-base.

Juros

Os juros futuros com vencimentos intermediários e longos inverteram o sinal de alta observado até o início da tarde e fecharam a sessão desta quarta-feira praticamente estáveis em relação aos ajustes anteriores. A dinâmica mais comportada seguiu o alívio proporcionado pelos Estados Unidos, onde um leilão de títulos de 10 anos realizado pelo Tesouro teve forte demanda e acentuou a queda dos Treasuries, que já cediam após publicação de números mais comportados de inflação do atacado do país.

Na ponta curta da curva, no entanto, a deflação mais fraca do que a esperada do IPCA de agosto seguiu como influência de alta sobre as taxas, e esfriou perspectivas de que a Selic seja reduzida ainda este ano.

Encerrados os negócios, a taxa de contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2027 avançou de 13,957% no ajuste anterior para 14,005%. O DI para janeiro de 2029 oscilou de 13,192% no ajuste da véspera para 13,200%. O DI para janeiro de 2031 caiu para 13,455%, vindo de 13,466% no ajuste de ontem.

Nos EUA, o índice de preços ao produtor (PPI, na sigla em inglês), publicado hoje, caiu 0,1% em agosto ante julho. A previsão de analistas consultados pela Factset era de alta, de 0,4%. Segundo Otávio Oliveira, gerente da tesouraria do Banco Daycoval, o PPI tranquilizou preocupações sobre possíveis repiques inflacionários decorrentes das tarifas impostas pelos EUA, e o mercado tem como praticamente certo que há espaço para dois cortes de juros pelo Fed ainda este ano.

“Podemos ter queda de juros mais acelerada lá fora”, diz Oliveira, para quem os números comportados do PPI foram mais importantes para a queda dos Treasuries hoje e, consequentemente, para a parte longa da curva doméstica. “Com o juro aqui se mantendo em 15%, aumenta o carry trade e teríamos possibilidade de tomada de risco por ativos brasileiros”, avalia.

Por aqui, o IPCA de agosto reforçou a percepção de que a Selic será mantida em 15% até o fim do ano, disse Oliveira. O dado recuou 0,11%, deflação mais fraca do que a prevista pela mediana do Projeções Broadcast (-0,16%). Mais do que o número cheio, novamente economistas classificaram a parte qualitativa do índice como ruim. A difusão aumentou de 50% em julho a 57% no mês passado. Nos cálculos do BV, a média dos núcleos inflacionários acelerou na passagem mensal, de 0,27% para 0,30%, embora os serviços tenham perdido fôlego, ao subirem 0,39% no mês, ante 0,59% na leitura anterior.

Já em 12 meses, a inflação de serviços avançou de 6% para 6,16%, observa Roberto Secemski, economista-chefe para Brasil do Barclays. “Esse grupo continua demandando atenção, como frequentemente destacado nas comunicações do Banco Central”, diz. Para Secemski, é pouco provável que haja sinalização de cortes em breve pelo Banco Central. No cenário do Barclays, o Copom vai realizar o primeiro corte na taxa básica em março de 2026.

No campo político, o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) teve mais uma sessão. Após os votos favoráveis à condenação proferidos pelos ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino ontem, o magistrado Luiz Fux teve posição dissidente e defendeu a anulação do processo no STF, que não teria competência para julgar a ação. “Ainda que possa haver alguma influência, o efeito da decisão de Fux na curva de juros e em outros ativos é limitado frente ao IPCA e ao PPI, que são dados concretos. E o julgamento ainda não acabou”, pondera Oliveira, do Daycoval.

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