A agenda escassa durante o pregão e a falta de sinalizações mais claras sobre o andamento da guerra comercial fez o Ibovespa oscilar entre leves altas e baixas por todo o pregão desta terça-feira, 15. Por fim o índice fechou em queda moderada, com investidores adotando postura cautelosa antes da divulgação do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) do Brasil e do Produto Interno Bruto (PIB) da China. Ações de mineração e siderurgia recuaram em bloco, destoando da alta do minério de ferro.
O Ibovespa fechou em queda de 0,16%, aos 129.245,39 pontos, com uma oscilação de menos de mil pontos entre mínima (-0,39%), aos 128.951,12 pontos, e máxima (+0,37%) aos 129.927,08 pontos. O giro financeiro somou R$ 20,4 bilhões.
“Tivemos na segunda-feira e na sexta-feira pregões com um movimento um pouco mais positivo em relação à guerra tarifária, após flexibilizações do presidente Donald Trump, que indicaram que poderia haver mais negociação. Mas também existe um temor com relação a avanços nos conflitos. Então quando olhamos essas duas forças, acaba que o mercado opera mais no zero a zero”, comenta o sócio da WMS Capital, Marcos Moreira.
Moreira destaca que por fim o Ibovespa se firmou no terreno negativo por conta da expectativa em relação ao PLDO. Também após o fechamento, Vale deve divulgar relatório de produção e vendas. Já às 23h, a China deve divulgar seu PIB do primeiro trimestre de 2025.
“O dado tende a fazer preço na Bolsa, porque uma economia mais fraca na China pode influenciar o Brasil, sobretudo por conta do minério de ferro”, afirma o sócio da One Investimentos, Pedro Caldeira. Desta maneira, a queda em bloco do setor metálico não surpreende, em queda que vai desde Vale ON (-1,01%) até CSN ON (-3,46%), destoando da alta de 0,99% e de 0,63% do minério de ferro em Dalian, na China, e em Cingapura, respectivamente.
Petrobras também teve forte pressão sobre o índice, recuando cerca de 2%, seguindo a baixa de 0,33% (WTI) e 0,32% (Brent) dos contratos futuros de petróleo, após a Agência Internacional de Energia (AIE) reduzir sua estimativa de crescimento da demanda para 2025 em cerca de 300 mil barris por dia, citando o impacto negativo esperado das tarifas americanas sobre o crescimento econômico global.
Dólar
O dólar encerrou a sessão desta terça-feira em alta de 0,66%, a R$ 5,8900, após máxima a R$ 5,9041 no início da tarde. O dia foi marcado por valorização global da moeda americana, dada a postura mais cautelosa dos investidores diante dos desdobramentos da guerra comercial. Além de falta de progressos em acordo com a União Europeia, os EUA sofreram nova retaliação chinesa.
No início dos negócios, a divisa até ensaiou um movimento de queda, com mínima a R$ 5,8340, mas trocou de sinal após as primeiras horas do pregão, em sintonia com o exterior. Termômetro do comportamento do dólar em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY – que recentemente furou o piso do 100,000 pontos, atingindo o menor nível em três anos – hoje voltou a subir, com máxima aos 100,276 pontos.
As taxas dos Treasuries recuaram, em um movimento clássico de busca por proteção em momento de aversão ao risco. Podem ter ocorrido também compras táticas, após a desvalorização expressiva dos papéis. No tumulto provocado pelo tarifaço de Trump, investidores haviam vendido Treasuries, com aumento de prêmio de risco relacionado aos EUA e temores de que a China de desfizesse dos títulos de forma agressiva.
“O dólar sobe com esse clima de incerteza em relação às tarifas de Trump. A China aumentou a retaliação contra os EUA, deixando de receber aviões produzidos pela Boeing”, afirma o especialista Davi Lelis, da Valor Investimentos. “Moedas emergentes são muito mais vulneráveis a choques externos. Vamos ter ainda muita volatilidade com essa perspectiva de mudanças das cadeias globais de produção por conta das tarifas.”
A China ordenou que companhias áreas locais deixassem de receber aeronaves da Boeing, como retaliação a tarifas de 145% impostas peles EUA a produtos do gigantes asiático. As empresas chinesas também têm que suspender compras de equipamentos e peças para aeronaves fornecidos por empresas americanas, segundo informação da Bloomberg.
Em publicação na rede social Truth Social, Donald Trump acusou a China de renegar acordos comerciais com agricultores americanos e com a Boeing. O presidente do EUA disse que os chineses foram “brutais” com o setor agrícola, assim como estão sendo ao não honrar compromissos com a fabricante de aeronaves. Além disso, Trump afirmou que os recursos obtidos com a sobretaxação de importações podem substituir a receita de impostos americanos, em um reforço da agenda protecionista.
À tarde, a secretária de Comunicação da Casa Branca, Karoline Leavitt, afirmou que mais de 75 países buscaram os Estados Unidos para negociar tarifas. Ela acredita que acordos poderão ser anunciados “muito em breve”. Leavitt acrescentou que Trump está aberto a negociações com a China, mas que “a bola está do lado chinês”.
O gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo, pondera que, apesar do ambiente marcado por pouco apetite ao risco no exterior, os ativos tanto aqui quanto lá fora já não exibem oscilações tão agudas como as observadas nos primeiros dias do tarifaço de Trump.
“Já vemos a tentativa de um movimento de busca de acomodação, apesar da falta da indefinição sobre as tarifas”, afirma Galhardo, que vê possibilidade de que o real possa começar, nos próximos dias, a espelhar também o retorno de ruídos fiscais domésticos, com a apresentação do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO). “As dúvidas são as fontes de receita para bancar as promessas do governo e ainda cumprir a meta fiscal. Isso faz com que o mercado mantenha posições cambiais defensivas”.
Como esperado, o PLDO, divulgado quando o mercado à vista já estava fechado, trouxe meta de superávit primário de 0,25% do PIB para 2026, com a banda de 0,25 ponto porcentual. A previsão é que o governo central alcance superávit primário de R$ 38,2 bilhões no ano.
Juros
Os juros futuros fecharam em alta, em movimento de correção moderada de parte das quedas acumuladas na últimas sessões, tendo as incertezas externas e fiscais como estímulos para ajuste. Sinais de falta de evolução nas negociações dos acordos que aliviem o impacto das tarifas de Trump sobre a economia global e cautela antes da divulgação do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026 levaram o mercado a recompor um pouco dos prêmios de risco, sobretudo nos vértices intermediários. O documento foi divulgado no fim da tarde, porém sem reações no mercado de juros.
No fechamento, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 subia a 14,725%, de 14,686% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2027 estava em 14,22% (de 14,16%). O DI para janeiro de 2029 terminou com taxa de 14,11%, de 14,04%.
As taxas estiveram em direção contrária ao dos rendimentos dos Treasuries, que caíram, mas em ambos os casos o pano de fundo é o mesmo, ou seja, as preocupações com os efeitos do tarifaço sobre a economia mundial. Apesar dos EUA manterem o discurso de que estão sendo procurados para acordos, pouco de concreto se viu até agora. Segundo a Casa Branca, em torno de 75 países estariam buscando uma negociação e acordos serão anunciados “muito em breve”. Representantes da União Europeia e os Estados Unidos se reuniram, mas os relatos à Bloomberg eram de que havia pouca clareza sobre a posição americana.
“O mercado opera sem muita convicção. As taxas tiveram queda grande e daqui para frente é esperar para ver”, afirma o economista-chefe da Terra Investimentos, João Mauricio Rosal, segundo o qual a pergunta do momento, de qual será o impacto sobre a atividade, segue sem resposta. “Deve haver aumento da demanda da China por commodities e da importação do Brasil por manufaturados. Acredito que o saldo para o País será positivo”, diz.
A percepção é de que o viés desinflacionário vindo do exterior pode encurtar o ciclo de alta da Selic, mas há dúvidas sobre se, de fato, haverá condições para afrouxamento da política monetária em 2025. “Até por questões de natureza fiscal, o BC deve elevar a taxa e depois deixar o juro parado por um bom tempo. Deve optar por um ciclo mais achatado, pois não vai jogar a toalha muito antes de deixar a inflação perto dos 3%”, opina Rosal.
No PLDO, o Ministério do Planejamento apresentou uma projeção de IPCA para 2026 de 3,5%, 0,5 ponto porcentual acima da meta de 3%, e bem mais otimista do que a mediana da pesquisa Focus, de 4,50%. Como esperado, o documento confirmou a meta fiscal de superávit primário de 0,25% com bandas de 0,25 ponto, para 2026 e 2027. Para 2028, a meta é de superávit de 1%, e para 2029, de saldo positivo de 1,29%, com a mesma banda de variação em ambos os casos.
O mercado vê com ceticismo a possibilidade de o governo entregar tais resultados, especialmente no ano que vem, que é ano eleitoral. Mais do que o primário, há grande preocupação com a trajetória da dívida bruta que, segundo o PLDO, deve atingir 81,8% no ano que vem e o pico de 84,2% em 2028.