Apesar dos solavancos no mercado global de moedas ao longo da tarde com a confirmação pela Casa Branca de imposição de tarifas de importação a México, Canadá e China a partir de amanhã, o dólar à vista emendou o décimo pregão consecutivo de baixa por aqui e encerrou janeiro com desvalorização de 5,56%, após ter subido 2,98% em dezembro e 27,34% em 2024. Foi a maior queda mensal da moeda americana desde junho de 2023 (-5,59%).
Depois de amargar o pior desempenho entre divisas emergentes no fim do ano passado, em meio a remessas recordes ao exterior e a uma crise de confiança na política fiscal, o real exibiu no primeiro mês de 2025 o segundo melhor desempenho entre as principais moedas, entre desenvolvidas e emergentes, atrás apenas do rublo russo.
O economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala, atribui a apreciação do real, em primeiro lugar, a uma correção do “exagero completo” da alta do dólar no fim de 2024. Em segundo lugar, Gala cita a “resposta muito enérgica” do BC, que mostrou firmeza no combate à inflação e deixou claro que vai fornecer a liquidez de que o mercado precisa.
“E o resultado fiscal do governo central em 2024 veio melhor do que o esperado. Praticamente se zerou o déficit primário, se for descontado o socorro ao Rio Grade do Sul”, afirma Gala, em referência a dados divulgados ontem à tarde. “Se não fosse a desoneração do Perse (programa de apoio ao setor de eventos), haveria superávit primário. Inacreditável a histeria fiscal perto do resultado de fato.”
Para o sócio e diretor de investimentos da Azimut Brasil Wealth Management, Leonardo Monoli, a queda do dólar em janeiro tem como componente relevante a expressiva redução das apostas contra o real no mercado de derivativos pelos investidores estrangeiros – estimulada pelo aumento de atratividade das operações de carry trade, com a estratégia do Banco Central de seguir atuando com a oferta de leilões de linha com compromisso de recompra.
Ao analisar o chamado carrego ajustado pela volatilidade, nota-se que, em uma janela móvel de três meses, essa relação para o real tornou-se mais atrativa do que para o peso mexicano. “É algo que não acontecia desde o final de 2021”, observa Monoli.
Hoje, o dólar até abriu em alta, com máxima a R$ 5,8732, mas perdeu força pela manhã e chegou a ensaiar uma aproximação do piso de R$ 5,80, tocando mínima a R$ 5,8121, em meio à disputa técnica entre “comprados” e “vendidos” pela formação da última taxa Ptax do mês. Depois de rodar entre R$ 5,83 e R$ 5,85 à tarde, o dólar fechou a R$ 5,8366, em queda de 0,28%.
Termômetro do comportamento da moeda americana em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY subiu mais de 0,50%, acima dos 108,300 pontos, com aceleração dos ganhos à tarde, após a Casa Branca confirmar tarifas de importação de 25% para México e Canadá, além de 10% para a China, a partir de amanhã. Apesar do aumento da aversão ao risco, o peso mexicano teve leve apreciação, enquanto o dólar canadense apresentou um pequeno recuo.
Entre indicadores, o Departamento do Comércio dos EUA informou que o índice de preços de gastos com consumo (PCE, na sigla em inglês) – medida de inflação preferida pelo Federal Reserve – subiu 0,3% em dezembro e 2,06% em 2024, em linha com as estimativas dos analistas. Os núcleos do PCE – que exclui itens mais voláteis como alimentos e energia – também vieram em linha com as expectativas.
Na última quarta-feira, 29, o Fed optou por uma pausa no processo de redução de juros, ao manter a taxa básica inalterada, na faixa entre 4,25% e 4,50. Mas o presidente do BC americano, Jerome Powell, deixou a porta aberta para a retomada dos cortes.
“O Fed adotou uma postura mais cautelosa para avaliar os impactos dessas medidas (tarifas anunciadas por Trump) nos dados econômicos. Além disso, o chairman do Fed destacou que acredita que a política monetária ainda está longe do nível neutro, o que considera uma posição favorável para avaliar os próximos passos do banco central”, afirma a economista-chefe da Armor Capital, Andrea Damico.
A pausa do Fed e o anúncio de tarifas por Trump não conseguiram abalar o real. A perspectiva é de aumento da atratividade das operações de carry trade, com as altas contínuas da Selic. Na quarta, o Copom anunciou, como esperado, elevação da taxa Selic em 1 ponto porcentual, para 13,25%, e reforçou a promessa de nova alta de 1 ponto em março, deixando em aberto as decisões a partir de maio.
Para o economista André Perfeito a queda do dólar em janeiro, além do fato de o real ter “perdido muito” em dezembro, é explicada pelos efeitos cumulativos das altas de juros, que começam a fazer efeito. “Está ficando ‘caro’ ficar vendido em reais”, afirma Perfeito, em nota.
Ibovespa
Com apoio de Petrobras na sessão (ON +0,68%, PN +0,80%), cujas ações chegaram a acentuar ganhos acima de 1% após a confirmação de aumento do diesel a partir deste sábado, o Ibovespa buscou se firmar aos 127 mil pontos, mas não conseguiu sustentar a marca no fechamento, em razão do fraco desempenho das ações de bancos e, em especial, do setor metálico. Assim, o índice da B3 oscilou dos 126.057,34 aos 127.531,99 pontos, e encerrou em baixa de 0,61%, aos 126.134,94, com giro a R$ 21,6 bilhões nesta última sessão do mês. Em janeiro, acumulou ganho de 4,86%, comparado a perda de 4,79% no mesmo mês do ano passado. Na semana, em alta de 3,01%, teve seu melhor intervalo desde o período entre 5 e 9 de agosto (+3,78%).
Apesar da confirmação nesta tarde de que, assim como Canadá e México (com 25%), as exportações da China aos Estados Unidos também serão taxadas (em 10%, a partir de amanhã) ter afetado negativamente o Ibovespa na sessão, janeiro se confirmou como o primeiro avanço para o índice desde agosto – e também como melhor abertura de ano desde 2022, então em alta de 6,98%.
Ainda assim, a última sessão do mês foi turvada, do meio para o fim da tarde, por sinais de que a Casa Branca parece estar disposta a iniciar uma guerra comercial, o que afetou também o desempenho do petróleo, enfraquecendo-o em direção ao fechamento em Londres e Nova York. O sinal negativo obscureceu o efeito proporcionado por Petrobras desde o começo da tarde, após a estatal ter anunciado reajuste de R$ 0,22 por litro para o diesel nas refinarias a partir de amanhã, elevado a R$ 3,72. O combustível estava sem reajuste havia 401 dias, com uma defasagem de 17% em relação aos preços praticados no mercado internacional, reporta a jornalista Denise Luna, do Broadcast.
Com a deterioração da percepção de risco sobre emergentes como o Brasil, o desempenho de Petrobras deixou de ser o suficiente para defender o Ibovespa. No fechamento, Vale ON mostrava queda de 1,56% e as perdas no setor metálico chegavam a 4,09% (Gerdau Met). Os bancos, que operavam em bloco no positivo mais cedo, também em parte oscilaram para baixo, com destaque para Itaú (PN -0,65%, na mínima do dia no fechamento) e Bradesco PN (-0,41%). Na ponta perdedora do Ibovespa, Vibra (-5,07%), RD Saúde (-4,35%) e Gerdau Metalúrgica (-4,09%). No lado oposto, Totvs (+4,45%), BTG (+1,62%) e Cogna (+1,44%).
“Janeiro foi positivo após a forte correção do fim do ano passado, em que houve certo exagero. Ainda que os problemas domésticos não estejam resolvidos, os ativos brasileiros estavam muito descontados, então a recuperação se tornou natural. A perspectiva, contudo, ainda é de voo de galinha”, diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research, mencionando as incertezas sobre a arrecadação e o fiscal ao longo deste ano, que haviam resultado em prêmios significativos sobre o câmbio e a curva de juros. “Melhora de janeiro pode ser espuma”, acrescenta. “Mas as coisas podem se ajeitar em direção melhor se o dever de casa for feito.”
Para Bruna Centeno, economista e advisor da Blue3 Investimentos, o anúncio do diesel era o ponto positivo do dia até a mudança de direção do Ibovespa, do meio para o fim da tarde. “Foi um sinal de que a governança da companhia (Petrobras) permanece sólida, em momento de margens saudáveis tanto no diesel como na gasolina, o que fez com que o mercado operasse no papel durante a sessão”, diz.
Apesar dos desafios no quadro mais amplo, as expectativas para o desempenho das ações no curtíssimo prazo ficaram mais otimistas no Termômetro Broadcast Bolsa desta semana. A previsão majoritária passou a ser de alta para o Ibovespa, após estimativa anterior de estabilidade. Entre os participantes, 50,0% esperam que o índice avance, enquanto as fatias que esperam estabilidade e baixa são de 37,5% e 12,5%, respectivamente. Na edição anterior, a expectativa de ganhos tinha 37,5% do universo; a de variação neutra, 50,0%; e de queda, 12,5%.
Em dólar, o Ibovespa havia chegado ao fim de 2024 a 19.462,70 pontos, refletindo a perda nominal na casa de 10% para o índice e o avanço de 27% para a moeda americana em relação ao real, no ano. Agora, no encerramento de janeiro de 2025, em que o dólar acumulou perda de 5,56% frente ao real, acomodando-se abaixo dos R$ 6, a R$ 5,83, o Ibovespa, na moeda americana, foi a 21.611,03 pontos, acima do nível em que estava no fechamento de novembro passado, então a 20.940,45 pontos.
Contudo, permanece em nível abaixo do que se encontrava no fim de outubro (22.437,48 pontos), mês em que o dólar já havia acumulado alta de 6,13% e o Ibovespa, perda nominal de 1,60% – e que se agravaria em novembro, com -3,12%, e dezembro, -4,28%.
Juros
A desinclinação na curva de juros perdurou no período da tarde. A confirmação pela Casa Branca de que as tarifas contra México, Canadá e China devem começar amanhã, 1º de fevereiro, puxou o vértice curto dos DIs. Já a ponta longa – que cedeu menos na véspera – passou boa parte do pregão com viés de baixa, amparada por um déficit um pouco menor do setor público consolidado, encerrando a sessão, por fim, perto do ajuste, com o mercado se preparando para retorno do Congresso na semana que vem. No pano de fundo, a Petrobras anunciou nesta sexta-feira um reajuste no diesel, mas o impacto direto para o IPCA tende a ser limitado, segundo economistas.
No balanço mensal, houve fechamento da curva. A taxa para janeiro de 2026 fechou 50 pontos-base, o para 2027, 92 pontos-base, e o para 2029, 98 pontos-base.
Nesta sexta-feira, a taxa de depósito interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 subiu para 14,940%, de 14,860% no ajuste anterior, e o para janeiro de 2027 avançou a 15,035%, de 14,934%. Já o DI para janeiro de 2029 encerrou estável a 14,77%.
“Acho que tem um componente surpresa na decisão de EUA começarem a taxar México, Canadá e China neste sábado, o mercado vinha operando na expectativa de que o presidente Donald Trump fosse blefar e postergar o início das tarifas. Além disso, essas ações aumentam o risco de uma guerra comercial ampla e de uma escalada inflacionária nos próximos meses nos EUA”, avalia o economista-chefe da Nova Futura, Nicolas Borsoi.
A ponta longa da curva de juros brasileira, contudo, passou boa parte do pregão com viés de baixa. “O movimento foi em função do resultado fiscal, com dívida pública menor”, considera o economista-chefe da Equador Investimentos, Eduardo Velho.
O setor público consolidado teve déficit primário de R$ 47,553 bilhões em 2024, um pouco menos negativo do que a mediana do Projeções Broadcast (-R$ 48,80 bilhões). Já a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) passou de 77,7% em novembro para 76,1% em dezembro.
O mercado também focou na Pnad Contínua, que mostrou uma taxa de desocupação em 6,2% no trimestre encerrado em dezembro, no teto das previsões do Projeções Broadcast.
Para o diretor de Investimentos da Nomos, Beto Saadia, grande parte do alívio nos juros longos também se refere às expectativas para a eleição de 2026. “Há uma série de imbróglios em Brasília, segundo as últimas notícias, e a questão do mercado tentando aproveitar eventual burburinho de uma não reeleição de Lula faz até mais efeito do que esses dados micro”, considera.
Na próxima semana, o mercado ficará atento à retomada das atividades no Congresso e às eleições que resultarão na troca de comando nas duas casas.